
Marcelo Whately
Aspirante a especialista em carne bovina: agregação de valor e promoção de seu consumo. Analista de mercado da Equipe BeefPoint de set/11 a fev/13.
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Minha interpretação sobre a classificação da OMS sobre o potencial cancerígeno de produtos processados de carne e de carnes vermelhas
*Material escrito por mim e divulgado (10/nov/2015) em nome da Vila Beef, empresa varejista em que atuo no mercado de carne bovina.
No dia 26/out a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou nova classificação para carnes processadas e carne vermelha em relação aos seus potenciais como causadoras (ou possíveis causadoras) de câncer no intestino grosso (devido à alteração de células do órgão por meio de compostos formados após a digestão deste alimento). Evidências menos conclusivas relacionaram também estes alimentos como potenciais causadores de câncer de pâncreas e da próstata.
O estudo foi realizado pelo IARC (Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer, sigla em Inglês). Veja aqui o comunicado à imprensa http://www.iarc.fr/en/media-centre/pr/2015/pdfs/pr240_E.pdf e a publicação oficial: Carcinogenicity of consumption of red and processed meat – The Lancet Oncology.
As carnes processadas ficaram como alimentos Cancerígenos (Categoria 01) e carnes vermelhas (de mamíferos: bovina, suína, ovina, caprina, equina) foram classificadas como Provavelmente Cancerígenas (Categoria 02A).
As categorias criadas pelo IARC para classificar as substâncias conforme seu potencial causador de Câncer são:
- Grupo 01: Cancerígeno para humanos
- *Os dados científicos existentes evidentes para comprovar sua relação com o desenvolvimento de Câncer.
- Grupo 02A: Provavelmente cancerígeno para humanos
- *As evidências existentes são limitadas para comprovar a relação da substância com o desenvolvimento de Câncer.
- Grupo 02B: Possivelmente cancerígeno para humanos
- Grupo 03: Sem classificação quanto ao potencial cancerígeno para humanos
- Grupo 04: Provavelmente não-cancerígeno para humanos
Indo direto ao ponto, concluímos que a OMS manteve o consumo de carne processada e carne vermelha permitidos, porém sem exagero.
Coisa simples: consuma o alimento que quiser, com bom senso. Mantenha uma alimentação equilibrada (carboidratos, proteínas, lipídeos, frutas, vegetais, fibras…) e pratique atividade física regularmente.
Pensando sobre a mesma perspectiva, a ocorrência de câncer na humanidade vem aumentando com o passar das décadas e com a evolução da tecnologia. Cada vez mais alimentos processados (industrializados), mais sedentarismo, mais poluição, mais carros, mais lixo, e até mais pessoas no Planeta Terra. Desta forma é claro que a ocorrência da doença aumente, não? Como a ocorrência de qualquer outra doença é maior quanto maior o número de pessoas existentes.
Tudo consumido em excesso pode se tornar cancerígeno. Se comermos produtos processados de carne todo dia por anos sem parar (como publicou a OMS: 50g/dia durante muitos anos), concordamos que ficamos mais susceptíveis ao câncer no intestino: aumentam as chances em 18% de desenvolvermos câncer colorretal, e restam 82% de chance de não desenvolvermos. Como curiosidade, no caso do tabaco, as chances aumentam 2000%.
Mas afinal, o que é carne processada segundo o IARC? É toda carne que se transformou por processo de salga, cura, fermentação, defumação e outros métodos para alterar o sabor ou melhorar a conservação. Por exemplo: linguiça, bacon, salsicha, presunto e até peito de peru (que não é carne vermelha).
A divulgação destas classificações do IARC pela OMS causou grande movimentação na mídia pelo mundo todo, tanto por quem apoia a decisão quanto por quem não concorda. A ABIEC (Associação Brasileira das Industrias Exportadoras de Carne) e a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) publicaram notas (primeira, segunda) fortalecendo as características nutricionais da proteína animal e sua importância na alimentação da população mundial.
Continuando, Samuel Aguiar Jr, cirurgião-oncologista do A.C.Camargo, disse que o problema de se colocar o consumo das carnes processadas na categoria 1 de risco, a mesma do tabaco e do amianto, é que nessa categoria geralmente não existe consumo moderado. “Você não fala para um paciente fumar ‘um pouquinho’, e sim para não fumar. Ninguém recomenda que alguém seja exposto a só ‘um pouquinho’ de amianto“, diz. No caso das carnes processadas, afirma, não é o caso de evitá-las, mas sim de remover da rotina – não há grande risco se o consumo for esporádico.
Além do mais, diversos relatórios, editoriais, colunistas e matérias de grandes redes de notícias e órgãos científicos publicaram sua posição. Ao revisar* este material podemos levantar pontos interessantes:
- O IARC já avaliou o potencial cancerígeno de aproximadamente 940 substâncias, e somente uma foi classificada no Grupo 04 (http://monographs.iarc.fr/ENG/Classification/).
- Dos 22 dois cientistas do IARC, sete não votaram a favor da publicação destas classificações. Praticamente um terço!
- O relatório científico não foi divulgado.
- “Embora haja evidências epidemiológicas para uma associação estatisticamente significativa entre o consumo de carne processada e o câncer colorretal, é importante enfatizar que o efeito é relativamente pequeno e o mecanismo está mal definido”, disse o professor Ian Johnson, membro emérito do Institute of Food Research do Reino Unido.
- O tamanho do risco não é classificado.
- Por exemplo, o potencial cancerígeno do consumo de carne processada de do tabaco não é o mesmo, porém estão no mesmo Grupo 01. Além do tabaco, também estão neste grupo bebidas alcoólicas, radiação solar, substâncias radioativas como o Rádio, vírus da Hepatite B e C, poluição do ar, benzeno, cinzas e serragem.
- Já no Grupo 02A, no qual a carne vermelha foi inserida, a erva mate também está. E o chimarrão e tereré, como ficam?
- O câncer colorretal é um raro tipo que pode ser prevenido com rastreamento por colonoscopia. Os pacientes devem iniciar esse exame após os 40 anos.
- O consumo de expressivas quantidades de verduras, legumes, frutas, concomitantemente à ingestão de carne vermelha, nos protege, pelo menos em parte, do efeito carcinogênico alertado pela OMS.
- Existem doenças mais letais do que câncer colorretal relacionadas ao consumo exagerado de carnes processadas.
- “Parece haver evidências sólidas de que dietas ricas em carnes processadas estejam associadas a um pequeno aumento da probabilidade de desenvolver câncer de cólon e reto, mas calcular o risco de cada um de nós é impossível”, Dr. Drauzio Varella.
Terminando, e refletindo, não entendemos o por quê do alarde. Sob a linha de estudo da OMS, praticamente tudo tem potencial cancerígeno. ‘Potencial’, e não relação direta. Afinal, esta anormal multiplicação celular é um mistério, hoje a medicina caminha para controlá-la, mas sua causa muito provavelmente é multi-fatorial.
Já vimos o ovo (sem gema, depois sem clara), o tomate e a laranja serem condenados e atualmente indicados ao consumo. Recentemente o glúten e a lactose foram condenados e já vemos notícias absolvendo-os. E hoje os produtos de carne processada e carne vermelha ganharam os holofotes.
Acreditamos na seriedade do IARC, OMS e demais órgãos responsáveis pela saúde humana. Também acreditamos que nós, a população, não entendemos a profundidade e a necessidade destes estudos, e incluo todos nesta ‘população’: consumidores, empresários do ramos alimentício e jornalistas por exemplo. Quem está por trás destes estudos com certeza têm suas razões, vivem em “outra esfera” científica observando e pesquisando a população mundial e suas tendências. Ou algo neste sentido.
O que acreditamos mesmo em relação aos alimentos e seu consumo em geral é na alimentação saudável.
*O material revisado foi:
Nacionais:
- www.ecycle.com.br/component/content/article/62-alimentos/3935-carnes-processadas-como-presunto-e-linguica-sao-avaliadas-como-carcinogenicas-para-humanos-segundo-associacao-ligada-a-oms.html
- Indústria da carne reage à relatório de agência da OMS | Valor Econômico
- IMB – A OMS, a carne vermelha, as mudanças climáticas e o controle estatal: a conexão é explícita
- Adeus bacon? Por Angelita Habr-Gama – 09/11/2015 – Opinião – Folha de S.Paulo
- Angelita é professora na Faculdade de Medicina da USP e presidente da Associação Brasileira de Prevenção do Câncer de Intestino. Em seu texto, ela explica que
- Carne, câncer e a realidade – 31/10/2015 – Julio Abramczyk – Colunistas – Folha de S.Paulo
- Julio é médico formado pela Escola Paulista de Medicina/Unifesp, faz parte do corpo clínico do Hospital Santa Catarina, onde foi diretor-clínico.
- Os suplícios da carne – 31/10/2015 – Drauzio Varella – Colunistas – Folha de S.Paulo
Internacionais
- www.iarc.fr/en/media-centre/iarcnews/pdf/Monographs-Q&A.pdf
- www.thelancet.com/journals/lanonc/article/PIIS1470-2045(15)00444-1/fulltext
- http://www.iarc.fr/en/media-centre/pr/2015/pdfs/pr240_E.pdf
- http://monographs.iarc.fr/ENG/Classification/
- How Red Meat Joined the 478 Other Things That Might Give You Cancer
- North American Meat Institute
- How Red Meat Joined the 478 Other Things That Might Give You Cancer
- Industry set to reject WHO’s processed meat carcinogens ruling – FT.com
- Industry reacts to red and processed meat report
- What Do Dietitians Think about Red Meat and Cancer? – Facts About Beef
- Red Meat, Processed Meat Labeled Cancer Risks by WHO – Bloomberg Business
- International agency to list processed meats as hazards | MEAT+POULTRY